Figuras do artigo escrito por Sheyla Fernandes sobre a obra Mise en Abyme.
terça-feira, 8 de julho de 2014
O renascimento e o barroco nas narrativas de Ilca Barcellos, texto de : Sheyla FERNANDES
O renascimento e o barroco nas narrativas de Ilca Barcellos
Sheyla Francisco Fernandes
sheyla.fernandes@gmail.com
O rompimento com a própria estética parece ser a tônica do último trabalho de Ilca Barcellos, artista de Florianópolis, cuja poética transita entre a organicidade da cerâmica – e do próprio fazer cerâmico – e as possibilidades de hibridismo da biologia.
Se o cientificismo, herança deixada pelo renascimento, é uma característica marcante em toda sua trajetória artística, visível no intenso trabalho de pesquisa sobre as possíveis mutações biológicas e a experimentação de diversos materiais cerâmicos, a dramaticidade barroca é o mais novo elemento em sua produção.
Sob o título “Mise en abyme” (Fig. 1), uma referência clara ao termo criado por André Gide, que pode ser traduzido como “narrativa em abismo”, o trabalho de Barcellos foi selecionado pelo edital Fernando Beck 2014, e abriu a mostra em 24 de abril, na Fundação Cultural Badesc, também em Florianópolis.
Utilizando-se de narrativas sobrepostas, onde a assimetria é uma constante, a obra representa o rompimento da artista com a própria estética, antes baseada na experimentação de materiais cerâmicos, e agora receptiva a uma nova matéria, o tecido, incorporado ao trabalho não como um elemento secundário, e sim como o regente da composição. É este novo material quem direciona a poética da artista para um novo terreno: a dramaticidade.
Fracionada em núcleos, a obra consiste em uma instalação que une organismos feitos em poliéster (Fig. 2), atados um ao outro por garras criadas em cerâmica, organizados em composições assimétricas e efêmeras, que se perdem e se reinventam a cada nova montagem. Esta reinvenção da composição permite à obra uma maior mobilidade e infinitas possibilidades de fruição.
Está na composição também o poder dramático da obra, evidenciado na disposição dos organismos em poliéster e na capacidade desses organismos expressarem emoções exacerbadas, mesmo constituindo-se de formas aparentemente sem expressões.
Contrastando com a assimetria das composições estão o equilíbrio e a harmonia entre os organismos em poliéster, criados todos sob a mesma cor, forma, textura e volume. Independente da composição criada, este equilíbrio e harmonia entre os organismos permanecem, o que também remete ao renascimento. Porém, enquanto no renascimento a harmonia e o equilíbrio estavam na obra como um todo, no trabalho de Barcellos a composição não é harmoniosa nem equilibrada, apenas os elementos que a constituem.
Seja por conta do hibridismo ou pela harmonia entre as formas, o trabalho de Barcellos dialoga com a produção da artista Ishibashi Yui, que também explora o cientificismo renascentista, e que traz na obra “Then,it returns slowly” (Fig. 3), cores, hibridismo e composição que remetem ao trabalho de Ilca Barcellos.
REFERÊNCIAS
GOMBRICH, Ernst H. A história da arte. Tradução: Álvaro Cabral. 16ª ed. Livros Técnicos e Científicos Editora, 1999.
PULSAR DA VIDA - GALERIA DE EXPOSIÇÕES SESC JOINVILLE.
DOMINGO - DIA 15 DE JUNHO - AS 19H30 -
GALERIA DE EXPOSIÇÕES SESC JOINVILLE (RUA ITAIÓPOLIS, 470 – AMÉRICA) - ABERTURA
DA EXPOSIÇÃO “PULSAR DA VIDA”, DE ILCA BARCELLOS - ENTRADA GRATUITA
Obras perpassadas por vitalidade espiritual pela força
de expressão, prenhes com intensa vida própria, não busquemos identificá-las
nos registros biológicos, elas se movem em todos os sentidos, mergulham em
nossa realidade, são o próprio significado do esforço da sobrevivência, remetem
às origens da vida oceânica, às contradições de atração/repulsão do
desconhecido, harmonia perfeita entre matérias díspares : a argila primeva e
maleável do sonho do Criador, massa moldável pela vontade, e o produto da indústria
química criada pelo homem, na matéria que se expande incontrolável como a vida
pulsante em seu interior, símbolo inato do senso do numinoso e do mistério da
criação artística, simplicidade e complexidade na articulação das formas
orgânicas entre estruturas vivas e por viver, analogias entrevistas e ritmos
intuídos, penetrando decididamente o espaço, na verdadeira essência do pulsar
da vida.
Obra de uma escultora, Ilca
Barcellos, ou sinalização da vida oculta numa palavra: existir.
Walter de Queiroz Guerreiro
Crítico de Arte (ABCA/AICA).
quinta-feira, 26 de junho de 2014
“Quando criamos algo, mergulhamos num espaço infinito de
possibilidades e inquietações que nos remete a um espaço de
transição indefinido entre o real e o imaginário”
Com dez exposições no currículo, Ilca Barcellos
(Pelotas,RS) graduou-se em biologia na Universidade
Federal de Santa Catarina, onde construiu sua carreira
de professora e lecionou no curso até 2005. Foi a partir da aposentadoria que Ilca despertou sua atenção para o mundo das artes e desde então vem realizando exposições pelo Brasil e pelo mundo. Em uma entrevista exclusiva, a artista discorre sobre seu trabalho, arte, a influência da biologia em suas obras e indica onde visitar exposições de artes em Florianópolis.
de professora e lecionou no curso até 2005. Foi a partir da aposentadoria que Ilca despertou sua atenção para o mundo das artes e desde então vem realizando exposições pelo Brasil e pelo mundo. Em uma entrevista exclusiva, a artista discorre sobre seu trabalho, arte, a influência da biologia em suas obras e indica onde visitar exposições de artes em Florianópolis.
1) Você é bióloga de formação e le-
cionou na UFSC até 2005. De onde
veio a inspiração para começar a
fazer arte?
Sou bióloga, com mestrado em botânica e lecionei até 2005, quando me aposentei pela UFSC. Entretanto, no período pós aposentadoria decidi ingressar
na arte. Penso que sempre tive um potencial para as artes, pois sempre gostei de desenhar e de fazer objetos tridimensionais, mas sempre utilizava desta habilidade como instrumento didático, para as aulas de Biologia.
2) De que forma a biologia influen- ciou e influencia nos seus trabalhos artísticos?
Penso que foram tantos anos ob- servando e estudando sobre a vida e os processos biológicos, que fica difícil a gente apagar esta memó- ria, e por isso ela se manifesta no meu processo artístico. Lembro que nas primeiras exposições me apropriava de forma lúdica de conceitos da biologia, como por exemplo, a transgenia e a nomen- clatura científica, para nomear os
Sou bióloga, com mestrado em botânica e lecionei até 2005, quando me aposentei pela UFSC. Entretanto, no período pós aposentadoria decidi ingressar
na arte. Penso que sempre tive um potencial para as artes, pois sempre gostei de desenhar e de fazer objetos tridimensionais, mas sempre utilizava desta habilidade como instrumento didático, para as aulas de Biologia.
2) De que forma a biologia influen- ciou e influencia nos seus trabalhos artísticos?
Penso que foram tantos anos ob- servando e estudando sobre a vida e os processos biológicos, que fica difícil a gente apagar esta memó- ria, e por isso ela se manifesta no meu processo artístico. Lembro que nas primeiras exposições me apropriava de forma lúdica de conceitos da biologia, como por exemplo, a transgenia e a nomen- clatura científica, para nomear os
bichos – plantas. Entretanto, estou
me libertando destas amarras da
Biologia e mergulhando muito
mais na arte.
3) Sua última exposição foi “Mise en Abyme” na Fundação Cultural Badesc em Florianópolis. Você pode nos falar um pouco dela, qual foi a inspiração, o material utiliza- do e o motivo do nome em francês? Acredito que a ideia para a criação da instalação nomeada Mise en Abyme veio da vontade de fazer grandes trabalhos, que não seriam viáveis para o processo cerâmi-
co devido ao peso , a técnica e a queima. Além disso, posso tam- bém acrescentar as provocações ou cutucadas do meu orientador
e artista visual Fernando Lindote, quando comentava que nāo me via apenas com uma ceramista. Na realidade, deve ser a soma de vá- rias coisas, que culminaram para que eu avançasse no meu processo artístico buscando a interação entre materiais híbridos, no caso do tecido com fibra de poliéster e a cerâmica. O título da expo Mise en Abyme (posto no abismo) vem
3) Sua última exposição foi “Mise en Abyme” na Fundação Cultural Badesc em Florianópolis. Você pode nos falar um pouco dela, qual foi a inspiração, o material utiliza- do e o motivo do nome em francês? Acredito que a ideia para a criação da instalação nomeada Mise en Abyme veio da vontade de fazer grandes trabalhos, que não seriam viáveis para o processo cerâmi-
co devido ao peso , a técnica e a queima. Além disso, posso tam- bém acrescentar as provocações ou cutucadas do meu orientador
e artista visual Fernando Lindote, quando comentava que nāo me via apenas com uma ceramista. Na realidade, deve ser a soma de vá- rias coisas, que culminaram para que eu avançasse no meu processo artístico buscando a interação entre materiais híbridos, no caso do tecido com fibra de poliéster e a cerâmica. O título da expo Mise en Abyme (posto no abismo) vem
Ilca Barcellos
da literatura e foi utilizado pela
primeira vez por André Gide no
sentido de expressar uma nar-
rativa dentro de outra narrativa.
No meu caso, me aproprio deste
termo para explicar esta instalação
híbrida que traz objetos/esculturas
dentro de outros objetos/escultu-
ras. Nesta exposição, faço esta re-
lação simbiótica entre os materiais
utilizados e suas formas. Temos o
fofo /amorfo do tecido que passa a
ser tensionado pelo rígido/ defini-
tivo das garras em cerâmica, que
se anastomosam estabelecendo
inúmeros arranjos com as formas
de tecido. No entanto, apesar das
diferenças entre os materiais existe
uma identidade, que se desvela
pela cor, pelas formas e pela orga-
nicidade. Tanto na fatura dos ob-
jetos em tecido costurados a mão
como na montagem da instalação
temos o jogo, o acaso que se ma-
nifesta, pelas inúmeras possibili-
dades de contato e de tensão entre
os objetos e pela reconfiguração e
rearranjo da instalação em função
do espaço expositivo.
4) O que é arte para você?
Criar é algo vital que me dá senti- do à vida. Quando criamos algo, mergulhamos num espaço infinito de possibilidades e inquietações que nos remete a um espaço de transição indefinido entre o real e o imaginário.
4) O que é arte para você?
Criar é algo vital que me dá senti- do à vida. Quando criamos algo, mergulhamos num espaço infinito de possibilidades e inquietações que nos remete a um espaço de transição indefinido entre o real e o imaginário.
5) Quais lugares em Florianópolis
você indica para quem quer visitar
uma exposição de arte?
Infelizmente, Florianópolis nāo
tem muitos espaços culturais
frente a demanda de artistas.
Como locais privilegiados para
expor podemos citar: MASC,
BADESC, MVM, MHSC, MIS,
Galeria Pedro Paulo Vecchietti,
Galeria Helena Fretta, Coletivo
artístico Na Casa, Galeria Ponto
da Arte, entre outros.
Ilca na abertura da exposição Mise en Abyme, na Fundação Cultural Badesc, em abril de 2014
Ilca na abertura da exposição Mise en Abyme, na Fundação Cultural Badesc, em abril de 2014
terça-feira, 17 de junho de 2014
Pulsar da Vida - exposição selecionada em 2014 - ESPAÇOS VISUAIS - REDE SESC DE GALERIAS. Esta é a segunda mostra itinerante e está Joinville, no período de 15/06 a 20/07. A exposição reúne um conjunto de obras com múltiplas faturas e uma mesma poética. São fotografias e esculturas produzidas por diferentes processos e materiais: cerâmica, EVA, espuma de poliuretano e uma instalação em tecido com fibra de poliéster e cerâmica. Crédito das fotos - impressas em PVC são de autoria de Sidney Kair.
Subscrever:
Mensagens (Atom)